segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Judiciário: um poder de costas para o país!

Marco Antonio Villa
O Globo

A Justiça no Brasil vai mal, muito mal. Porém, de acordo com o relatório de atividades do Supremo Tribunal Federal de 2010, tudo vai muito bem. Nas 80 páginas – parte delas em branco – recheadas de fotografias (como uma revista de consultório médico), gráficos coloridos e frases vazias, o leitor fica com a impressão que o STF é um exemplo de eficiência, presteza e defesa da cidadania.

Neste terreno de enganos, ficamos sabendo que um dos gabinetes (que tem milhares de processos parados, aguardando encaminhamento) recebeu “pela excelência dos serviços prestados” o certificado ISO 9001. E há até informações futebolísticas: o relatório informa que o ministro Marco Aurélio é flamenguista.

A leitura do documento é chocante. Descreve até uma diplomacia judiciária para justificar os passeios dos ministros à Europa e aos Estados Unidos. Ou, como prefere o relatório, as viagens possibilitaram “uma proveitosa troca de opiniões sobre o trabalho cotidiano”. Custosas, muito custosas, estas trocas de opiniões. Pena que a diplomacia judiciária não é exercida internamente. Pena. Basta citar o assassinato da juíza Patrícia Acioli, de São Gonçalo. Nenhum ministro do STF, muito menos o seu presidente, foi ao velório ou ao enterro. Sequer foi feita uma declaração formal em nome da instituição. Nada. Silêncio absoluto. Por que? E a triste ironia: a juíza foi assassinada em 11 de agosto, data comemorativa do nascimento dos cursos jurídicos no Brasil.

Mas, se o STF se omitiu sobre o cruel assassinato da juíza, o mesmo não o fez quando o assunto foi o aumento salarial do Judiciário. Seu presidente, Cézar Peluso, ocupou seu tempo nas últimas semanas defendendo – como um líder sindical de toga – o abusivo aumento salarial para o Judiciário Federal. Considera ético e moral coagir o Executivo a aumentar as despesas em R$8,3 bilhões.

A proposta do aumento salarial é um escárnio. É um prêmio à paralisia do STF, onde processos chegam a permanecer décadas sem qualquer decisão. A lentidão decisória do Supremo não pode ser imputada à falta de funcionários. De acordo com os dados disponibilizados, o tribunal tem 1.096 cargos efetivos e mais 578 cargos comissionados. Portanto, são 1.674 funcionários, isto somente para um tribunal com 11 juízes. Mas, também de acordo com dados fornecidos pelo próprio STF, 1.148 postos de trabalho são terceirizados, perfazendo um total de 2.822 funcionários. Assim, o tribunal tem a incrível média de 256 funcionários por ministro.

Ficam no ar várias perguntas: como abrigar os quase 3 mil funcionários no prédio-sede e nos anexos? Cabe todo mundo? Ou será preciso aumentar os salários com algum adicional de insalubridade?

Causa estupor o número de seguranças entre os funcionários terceirizados. São 435! O leitor não se enganou: são 435. Nem na Casa Branca tem tanto segurança. Será que o STF está sendo ameaçado e não sabemos? Parte destes vigilantes é de seguranças pessoais de ministros. Só Cézar Peluso tem 9 homens para protegê-lo em São Paulo (fora os de Brasília). Não é uma exceção: Ricardo Lewandovski tem 8 exercendo a mesma função em São Paulo.

Mas os números continuam impressionando. Somente entre as funcionárias terceirizadas, estão registradas 239 recepcionistas. Com toda a certeza, é o tribunal que melhor recebe as pessoas em todo mundo. Será que são necessárias mais de duas centenas de recepcionistas para o STF cumprir suas tarefas rotineiras? Não é mais um abuso?

Ah, abuso é que não falta naquela Corte. Só de assistência médica e odontológica o tribunal gastou em 2010, R$ 16 milhões. O orçamento total do STF foi de R$ 518 milhões, dos quais R$ 315 milhões somente para o pagamento de salários.

Falando em relatório, chama a atenção o número de fotografias onde está presente Cézar Peluso. No momento da leitura recordei o comentário de Nélson Rodrigues sobre Pedro Bloch. O motivo foi uma entrevista para a revista “Manchete”. O maior teatrólogo brasileiro ironizou o colega: “Ninguém ama tanto Pedro Bloch como o próprio Pedro Bloch.”

Peluso é o Bloch da vez. Deve gostar muito de si mesmo. São 12 fotos, parte delas de página inteira. Os outros ministros aparecem em uma ou duas fotos. Ele, não. Reservou para si uma dúzia de fotos, a última cercado por crianças. A egolatria chega ao ponto de, ao apresentar a página do STF na intranet, também ter reproduzida uma foto sua acompanhada de uma frase (irônica?) destacando que “a experiência do Judiciário brasileiro tem importância mundial”.

No relatório já citado, o ministro Peluso escreveu algumas linhas, logo na introdução, explicando a importância das atividades do tribunal. E concluiu, numa linguagem confusa, que “a sociedade confia na Corte Suprema de seu País. Fazer melhor, a cada dia, ainda que em pequenos mas significativos passos, é nossa responsabilidade, nosso dever e nosso empenho permanente”. Se Bussunda estivesse vivo poderia retrucar com aquele bordão inesquecível: “Fala sério, ministro!”

As mazelas do STF têm raízes na crise das instituições da jovem democracia brasileira. Se os três Poderes da República têm sérios problemas de funcionamento, é inegável que o Judiciário é o pior deles. E deveria ser o mais importante. Ninguém entende o seu funcionamento. É lento e caro. Seus membros buscam privilégios, e não a austeridade. Confundem independência entre os poderes com autonomia para fazer o que bem entendem. Estão de costas para o país. No fundo, desprezam as insistentes cobranças por justiça. Consideram uma intromissão.

5 comentários:

Anônimo disse...

E esse "supremo" composto de tantas dúvidas acerca de sua autonomia é que decide sobre as duvidas da sociedade.
Lamentavél!!!
Ivan Soua, Belágua-MA

Anônimo disse...

REALMENTE A DEMOCRACIA PRECISA AVANÇAR MUITO NESTA NAÇÃO. E ESTA MUDANÇA NÃO DEVE SER PELO SUPREMO, COMO É QUE ELES ENCONTRAN ESTOMAGO PARA AGUENTAR O QUANTO ESTÃO SENDO PESSOAS À MARGEM DA LEI. SE BOA PARTE DE NOSSO DINHEIRO ESTÁ A SERVIÇO DE 11 PESSOAS, É POR QUE TEM ALGO ERRADO. CERTAMENTE ESSE POVO(supremo) se acha o poder mais importante do país. ELES E ELAS NÃO O SÃO.
VIVA A CIDADANIA, MAS NÃO FALE ISSO NO SUPREMO!!!!!!!!!!!!!!!!!

DIMAS DOS SANTOS

José Atailson P. dos Santos disse...

A Semântica da palavra supremo referente ao STF perdeu a eficácia da inquestionabilidade e da obediência pela obediência visto que 11 "super-homens" egocêntricos não conseguem ver - e se vêem, não é de sua competência - a vida dos mais necessitados. Também esses togados estão presos a literatura jurídica, protegidos entre paredes de concretos frias no seu interior, sem contacto nenhum com a sociedade civil. Eles não são sociáveis, não fazem parte dos brasileiros que são milhões, mas de uma sociedade exploradoras de sangue de 16 milhões de miseráveis,de milhões de jovens sem perspectivas de sonhar porque não tem educação de qualidade, de uns milhares de sem teto e sem terras, incluem aí os índios vítimas secular deste poder... Há, a nosso ver, a convicção de que a sociedade civil organizada e nas ruas recontará a nova e verdadeira História do povo brasileiro. Esta era já chegou. Ninguém fugirá de responder pelo que fez... Ai de vós minoria dominadora, encarregada de fazer a justiça dentro dos princípios da legislação internacional e dos constitucionais e não o fazem. Não tardareis a prestar contas ao verdadeiro dono do poder: O POVO. Redes e Foruns da cidadania do Maranhão, Núcle de Pte. Vargas.

maria josé santos lima disse...

Há quanto tempo essa gentalha não vive na mordomia às nossas custas e o povo iludido, pensando que por serem os "homens da justiça", fossem diferentes dos bandidos. Graças a artigos como esse e gente que tem coragem de escancarar a verdade, passamos a ter noção do comportamento ridiculo de mais um grupo que comtribui para aumentar a pobreza no pais. Haja dinheiro para sustentar tamanha vergonha!

jo disse...

Crime organizado, supremo de q? Pra quem? pra q? pra piorar o q já é ruim, pra humilhar, coagir desfavorecer e favorecer ´da maneira que melhor lhe convir,punir e prender o pequeno q ousa coexistir com a fome, o desmprego, o mísero salário de necessidades massacrantes e ultrajantes nessa nossa sociedade.Supremo mesmo é o povo não esse bando de colarinho de branco e decisões sujas que livra quem rouba e penaliza quem trabalha, que favorece sem peso na consciência esse castelo de cartas marcadas onde pobre sempre é descartado deixado de lado punido por ser pobre. A AUSÊNCIA DA DEMOCRACIA, É O MAIOR FRUTO DA CORRUPÇÃO!!!

Jozimar bezerra