O golpismo não é só uma forma desavergonhada de rasgar a Constituição
de um país, seu ordenamento maior e livro em que se depositam os valores e
esperanças de um povo.
Ao rasgar a Constituição, os golpistas ultrapassaram qualquer limite
ou marco civilizatório, seja legal, moral ou ético.
O que define o golpismo, assim, não é só uma ação ilegal, como também
a falta de pudor já manifestada diversas vezes de forma pública, a mais
completa ausência de vergonha na cara, o mau-caratismo claro, evidente, sem
deixar qualquer sombra de dúvida.
Venha de onde vier, a falta de caráter é a marca mais indelével de um
golpista, sua patente registrada.
Os brasileiros que ainda possuem algum senso crítico todos os dias são
confrontados com exemplos vergonhosos praticados por essa quadrilha que se
instalou no governo do país.
Inúmeros exemplos já foram dados, o mais atual vem de ninguém menos do
que a “Ministra de Direitos Humanos”, Luislinda Valois, magistrada aposentada e
filiada ao PSDB.
Em documento encaminhado à Secretaria da Casa Civil do governo
golpista, com 207 páginas, a ministra apresenta justificativa para acumular
integralmente as duas remunerações que recebe (aposentadoria e subsídio de
ministro de Estado) que, somadas, totalizariam algo em torno de 61 mil reais, valor
que ultrapassaria e muito o teto constitucional, regra obrigatória para todos
os servidores públicos.
Atualmente, a “ministra peticionária da inconstitucionalidade”, recebe por mês R$ 30,4 mil pela aposentadoria
de desembargadora do Tribunal de Justiça da Bahia e, como ministra, recebe
somente R$ 3,3 mil, uma vez que tem descontados R$ 27,6 mil do subsídio, o
chamado “abate teto”, para se enquadrar na norma constitucional.
Se peticionar nessas condições já é ofensivo, uma vez que existe
disposição constitucional bem clara a esse respeito, muito embora seja costume do
judiciário e do ministério público inventarem situações para fugirem do teto
salarial, o embasamento da justificativa mostra claramente com quem estamos
lidando.
Eis, pois, a pérola de justificativa da “ministra de direitos humanos
do governo golpista”:
“De mais a mais, vale
acrescentar que o trabalho executado sem a correspondente contrapartida, o que
se denomina remuneração, sem sombra de dúvidas, se assemelha a trabalho escravo
o que também é rejeitado, peremptoriamente, pela legislação brasileira desde os
idos de 1888, com a Lei da Abolição da Escravatura, aliás, norma que recebeu o
nº 3533” (sic)
Só para termos uma noção do que a ministra fala, quando argumenta que a
legislação “peremptoriamente” rejeita o
trabalho escravo ou o que lhe é assemelhado, bom lembrar o como o Código Penal
Brasileiro define esse crime, previsto em seu rt. 149:
“Reduzir
alguém a condição análoga à de escravo, quer
submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva,
quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer
restringindo, por
qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o
empregador ou preposto.
§
1o Nas mesmas penas incorre quem:
I –
cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o
fim de retê-lo no local de trabalho;
II –
mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou
objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho”
Nesse sentido, não precisa o agente prender a vítima diretamente, basta criar condições
adversas para que ela não manifeste a sua vontade, restringindo o seu poder de
locomoção, submetendo-a a trabalho forçado, com jornada exaustiva, em condições
degradantes.
Na visão cínica da ministra, a sua situação, de alguma forma, adequa-se
perfeitamente ao que dispõe a norma acima mencionada.
Para ela, o fato de não poder acumular a sua aposentadoria e o
subsídio do cargo de ministro de Estado pode obedecer norma constitucional, mas
infringe norma bem anterior, permitindo que a sua situação se assemelhe ao
trabalho escravo, análogo a dos negros antes da Abolição da Escravatura.
E olha que a ministra está reclamando porque está recebendo o “teto” e
não o “mínimo”, como muitos trabalhadores e trabalhadoras; ou abaixo do
“mínimo”, como milhares de trabalhadores escravizados país à fora, fato que
deveria ser objeto da preocupação principal da pasta da “ministra”, ao invés de
ficar desperdiçando tempo, escrevendo 207 páginas para pleitear algo não só inconstitucional, mas indefensável,
eticamente execrável!
Depois da manifestação na semana passada do ministro do STF, Gilmar
mendes, outros “escravos modernos” resolveram colocar as suas manguinhas de
fora e tornar público que também estão sendo vítimas de trabalho escravo, reivindicando,
além da não aplicação do teto constitucional, adicional, imóvel funcional ou
auxílio moradia de R$ 6 mil, carro com motorista, transporte em jatinhos da FAB, diárias de viagem e o gabinete de trabalho
com assessorias diversas.
É ou não é cinismo na sua forma mais pura e acabada?
Como tem sido o padrão dos membros desse governo golpista e
quadrilheiro, o cinismo aqui não é só a manifestação do descaramento e da
desfaçatez, mas o uso da justificativa com a finalidade de colocar na defensiva
ou em dúvida quem se opõe, além, é claro, de achar que todo mundo é besta para
cair nessa armadilha do “se colar, colou!”
Os contribuintes brasileiros pagam mais do que o suficiente para quem
não produz nem mesmo o suficiente para se insurgir contra o retrocesso a
práticas escravistas no trabalho, regime degradante, extenuante, perigoso e de
baixa remuneração, como tem sido uma constante no país e que, com as novas leis
patrocinadas pelo governo golpista, ficarão ainda pior.
Os golpistas todos os dias deixam claro que já ultrapassaram qualquer
limite e estão cientes do que estão fazendo, não dando a menor importância para
leis, moralidade ou opinião pública.
Para Cesare Beccaria, pai do iluminismo penal, um dos
impulsos para quem comete crime é a esperança da impunidade, a certeza de que,
mesmo pego, irá se livrar de alguma forma.
Por conta disso, ensina, “um dos maiores travões aos
delitos não é a crueldade das penas, mas a sua infalibilidade”.
E adverte: “Quanto mais a pena for rápida e próxima
do delito, tanto mais justa e útil ela será”.
Mas, ao contrário do que ensina Beccaria, a oposição,
nesta incluídos as esquerdas, já descobriram uma forma “justa e útil” de punir
essa quadrilha, com a realização das eleições previstas para ocorrer lá em
outubro de 2.018.
Enquanto essa forma tardia de punição não chega, essa
quadrilha, ciente desse fato, pratica os
seus crimes, compactua com outros, destrói o Estado, entrega seu patrimônio e transforma o país em quintal de outras nações, porque tem não só a esperança, mas a certeza
de que nada, nem ninguém, irá detê-la, muito menos puni-la.