Dados veiculados sobre a festejada política econômica do governo exibem nítidas contradições. Se os números indicam o aumento do crescimento, consumo e prosperidade, por outro lado, os mesmos números mostram que o modelo de desenvolvimento adotado é insustentável, inviável e injusto.
Como decorrência natural dessa contradição, o atual modelo não será capaz de resolver os grandes, graves e complexos problemas da sociedade brasileira. Ao contrário, irá agravá-los e acentuá-los cada vez mais.
Isso porque o seu desempenho, o seu tão propalado sucesso e o seu objetivo maior se fundamentam não na resolução dos seculares problemas do nosso país, mas em garantir o pagamento dos juros e encargos da dívida brasileira, que, por sua vez, impede o Brasil de crescer o tanto que precisa para distribuir a renda necessária capaz de consolidar uma verdadeira democracia social.
À primeira vista, pelo fato de milhões de pessoas terem sido retiradas da linha da pobreza e outras tantas terem ascendido socialmente, pode-se imaginar que finalmente o país encontrou o seu rumo, para cumprir o seu destino de terra da promissão.
Em grande parte essa sensação de prosperidade só chegou ao conjunto da população por meio de programas de empréstimo e transferência de renda, o que possibilitou a entrada de milhões de pessoas no mercado de consumo, como forma de, na verdade, viabilizar a articulação e o fortalecimento das elites dirigentes, financiando-as e enriquecendo-as como nunca se viu na história desse país.
Assim, mais uma vez, as classes trabalhadoras e a sociedade brasileira estão à mercê de um plano econômico que revitalizou o patronato em sua estratégia de dominação e o pôs no comando da política e do Estado, agente social que sempre impediu o desenvolvimento aqui de uma nação independente e soberana.
Entre os segmentos fortalecidos está parte ligada ao setor agro-exportador, diga-se de passagem, o mais conservador, ainda amarrado com fortes laços, econômico-social e culturalmente, ao triste passado colonial.
Apesar da sua modernização externa, com uso do GPS, carros e máquinas de última geração, que não passam de verniz, a cabeça e a linguagem ainda remetem à casa grande e de lá parecem não querer se desgarrar. Não só a cabeça, mas as indumentárias, como o chapéu, as botas e muitas vezes o chicote.
Não são à toa que esses símbolos identificam essa parte da elite, eles apenas evidenciam semelhanças com o passado colonial, principalmente nas relações de trabalho e na produção econômica.
Por incrível que isso possa parecer, mas, passados mais de 123 anos da abolição legal da escravatura, essa indigna forma de sujeição humana, ainda é nesse setor, segundo informações de instituições públicas e organizações da sociedade civil, que se observam as maiores violências nas relações trabalhistas.
Esgotamento físico, trabalho degradante, insalubridade, exposição à produtos tóxicos, uso da ameaça e da intimidação na celebração e no desfazimento dos contratos, quando não a redução pura e simples de seres humanos à condição semelhante a de escravo, são apenas algumas espécies das milhares de ocorrências registradas.
Apesar dos reiterados flagrantes e das frequentes exposições dessas mazelas, parece que nada ou quase nada constrange essa elite a ponto de mudar o seu comportamento ilícito.
Talvez seja por funcionar coeso em sua defesa um exército, integrado pelos soldados sem armas dos meios de comunicação, a prontidão das milícias armadas, quase sempre com componentes das forças de segurança do Estado, até chegar aos “generais de campo”, encastelados no poder judiciário, com as suas decisões já esperadas ao primeiro berro.
Semelhanças também quanto à produção econômica que, para dizer a verdade, não a identifica melhor do que a palavra exploração, tanto em relação ao Estado, seu eterno financiador, quanto à natureza, que na compreensão dessa elite deve ser transformada toda em matéria-prima destinada à exportação, o que a faz sonhar diariamente com a apropriação de todas as terras, perpetuando conflitos agrários e provocando impactos ambientais consideráveis.
Não custa nada mencionar que parte significativa do nosso tão festejado crescimento econômico está atrelado visceralmente a esse setor, nomeado pela política econômica para ser o responsável pelo desempenho positivo da balança comercial que, unido ao superávit primário, servem para o governo honrar seu principal compromisso, qual seja: pagar os juros da dívida externa.
Se uma das bases da política econômica é insustentável, do ponto de vista social e ambiental, à segunda se acrescenta apenas a marca da injustiça que a caracteriza, uma vez que superávit primário não é nada mais, nada menos, do que um termo usado para definir quanto dinheiro um governo economiza para pagar os juros de sua dívida.
E como um governo, num país tão desigual e injusto, economiza dinheiro?
Ora, para o governo é simples, basta realizar cortes nos gastos públicos ou, em caso de ser impossível, elevar a arrecadação tributária, assim produzirá o excedente necessário ao pagamento dos encargos da dívida.
Isto quer dizer que quanto mais o governo “ajusta as contas”, "aperta o cinto", “corta despesas”, na verdade o que ele faz, numa linguagem para que todos entendam, é fazer todo esforço para sobrar mais dinheiro para quitar os débitos com o mercado, recorrendo ao artifício de aumentar tributos como forma de compensar a insuficiência dos cortes.
Na verdade, esse "esforço fiscal", como os economistas do governo e das instituições financeiras costumam dizer, não passa de dinheiro retirado pelo governo dos contribuintes, da população em geral, em particular dos mais pobres, através de impostos, contribuições e outros tributos, para transferir aos mais ricos, chamados de investidores ou credores, nome dado às sanguessugas e abutres dos países pobres ou em desenvolvimento.
Na prática, obter um superávit significa ter menos dinheiro no caixa do governo para investir. Quanto maior for, menos recursos haverá para aplicar nos programas governamentais necessários para diminuir a desigualdade ou erradicar situações de injustiça social.
É o resultado positivo dessa conjunção, para o governo e a bolsa de valores, que desperta e orienta a confiança dos investidores estrangeiros na política econômica do governo, servindo como termômetro para que os mesmos apliquem no país as suas finanças, sabendo que terão o retorno prometido nas suas aplicações.
Até quando essa política econômica continuará sendo a base do desenvolvimento no país, ninguém sabe, mas está cada vez mais claro que ela não resolverá os principais problemas sociais do Brasil, pois é insustentável, inviável e injusta, e acabará nos conduzindo novamente à beira do abismo, caso não haja mudança de rota.
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