sexta-feira, 20 de maio de 2011

Todo o poder emanda do povo

Em artigo postado no sítio Terra Magazine, o ex-governador de São Paulo, Cláudio Lembo, traz para a discussão pública a questão da forma de preenchimento dos cargos do Poder Judiciário, que no seu entendimento já deveria contemplar a via do sufrágio (eleitoral) como maneira de legitimar a escolha.

No Maranhão, bom que se frise, as entidades organizadoras do Tribunal Popular do Judiciário não ousaram somente no que diz respeito à forma como os casos de violação foram colhidos junto ao povo, à metodologia de trabalho, capaz de propiciar grandes mobilizações pelo Estado todo, incluindo a temática como um dos pontos centrais do enfrentamento da sociedade civil na construção de um país verdadeiramente democrático.

Também ousaram em abrir debate sobre a legitimidade do Poder Judiciário, até agora único poder alheio à vontade popular, funcionando desvinculado do soberano, o povo, sujeito de onde deriva todo e qualquer poder num regime democrático, segundo a nossa carta magna.

Esse debate é, nesse instante, crucial para os que defendem um re-ordenamento das instituições republicanas, não só para garantir a mais  ampla participação popular nos destinos do país, como também elevar  o Estado brasileiro à categoria de protetor, defensor e promotor dos direitos humanos.

Para a direita brasileira e os conservadores em geral esse debate não interessa, uma vez que se sentem proprietários seculares dos cargos do Poder Judiciário brasileiro, apenas afirmando, antes do silencio, de que a soberania popular não o alcança, sendo incompatível a escolha de juiz pelo povo, residindo um preconceito de que esse tipo de escolha mancharia o exercício da jurisdição.

Quanto à esquerda e aos progressistas em geral, resta a perplexidade, a falta de acúmulo de discussão e a cômoda defesa do atual modelo, eivados que estão do preconceito da direita, restando o oportunismo na ocupação do Estado a partir de acordo com as elites.

Como ninguém até aqui se apresentou de forma corajosa nesse debate, eis abaixo o artigo de Cláudio Lembo, um liberal que busca nas iniciativas bolivianas motivos para questionar a estrutura do Estado Brasileiro, vendo com bons olhos a novidade.

Boa leitura e boa discussão.


Eleição para juízes. Por que não?

Fizemos nossa reforma. Poucas foram as consequências. Criaram-se mais organismos. Alargou-se a burocracia. De prático e sensível, pouco se obteve.

Fala-se, aqui, da Reforma do Judiciário. Aquela da Emenda 45 à Constituição Federal. As intenções eram muitas. A realidade mostrou-se avara.

Os operadores do Direito se encontram extenuados. Os jurisdicionados – em condições de procurar a Justiça – desencantados. Um processo judicial é mais demorado que uma longa vida.

Os resultados aleatórios. A jurisprudência, até ser harmonizada, demora anos. Os tribunais dos estados federados mostram-se autônomos. Atinge- se o equilíbrio só quando os tribunais superiores da União se pronunciam.

É preciso ter paciência. E bons advogados. Estes só se mostram disponíveis para os clientes economicamente fortes. A maioria da sociedade fica, pois, marginalizada.

O acesso à Justiça é direito constitucional. É risível. Não basta ingressar nos tribunais. É necessária a paridade de armas. A diferença é brutal entre a cidadania e os grandes grupos ou os entes governamentais.

O cidadão sem nome está fadado ao ostracismo judicial. Fica fora do jogo. Não tem condições mínimas de estar em Juízo. E mais. Ingressar-se com uma ação, implica na procura de uma tortura moral.

O processo brasileiro é fruto de personalidades presas a valores europeus. Foram à Itália, à Áustria e à Alemanha e recolheram elementos da lei processual desses países.

Outras realidades. O processo, em seus primórdios, foi imaginado a partir dos atos previstos nas atividades inquisitoriais. Para o Santo Ofício da Inquisição, manter o réu vinculado ao processo era forma de suplício.

Podiam os inquisidores obter confissões e arrecadar custas e bens do réu indefeso. Era exatamente o que desejava a máquina inquisitorial. O processo atual, em pleno estado laico, recolhe seus parâmetros naqueles procedimentos.

A Reforma do Judiciário, contida na Emenda 45, foi elaborada com alto grau de elitismo. Não se aprofundou na realidade efetiva da Justiça brasileira, que deve ser examinada e alterada.

O tema é recorrente. Volta, agora, à tona em razão de reforma do Judiciário proposta pelo governo da Bolívia. Evo Morales, este conhecido presidente da República, em sua visão popular, faz afirmações contundentes e espalhafatosas.

Diz ser o Judiciário boliviano fruto direto do colonizador. Nada tem em comum com a sociedade. Esta pode ser uma visão simplista da realidade institucional boliviana.

Contém, contudo, espaços de verdade. O formalismo e a excentricidades do processo – por toda a América Latina – demonstra que os acadêmicos não se preocuparam em captar valores e tradições nacionais autênticos.

Desejavam os processualistas apenas expor uma erudição vaidosa e repleta de orgulho. Iam aos códigos europeus e os transplantavam sem qualquer preocupação de ver rejeitadas suas elucubrações.

Ai de quem ousasse se opor à cultura jurídica dos antigos catedráticos das velhas escolas de Direito. Seria marginalizado e indigno de convívio social. Ficaria fora do sistema.

Processualista bom era processualista capaz de citar os clássicos sem qualquer traço de crítica. Tal como desejava a escolástica presente no pensamento dos “sábios” de outras épocas.

Morales, em suas provocações, quer mais. Deseja que os membros das altas cortes sejam escolhidos – em eleições – pelo povo. Parece estranho e arrojado.

Mas, seria cabível que os juízes escolhidos por recomendação do Executivo passassem pelo crivo da vontade popular. Por que não? Certamente, poderia surgir um Cacareco. Mas, em compensação, muitos bajuladores de ocasião estariam afastados da nobre missão de julgar.

Cláudio Lembo é advogado e professor universitário. Foi vice-governador do Estado de São Paulo de 2003 a março de 2006, quando assumiu como governador.

6 comentários:

CLEMILTON disse...

TRIBUNAL POPULAR DO JUDICIARIO E OBSERVATORIO DA JUSTIÇA E CIDADANIA SAIU NA FRENTE NESSA DICUSSÃO AQUI NO MARANHÃO.

VALDEJANE COSTA disse...

Bom seria mesmo se os magistrados fossem escolhidos pelo povo e com mandatos predeterminados, talvez assim a justiça não seria tão lenta e difícil.

Ianaldo Pimentel disse...

TÁ NA HORA DE AMPLIAR ESSA DISCUSSÃO,E FAZER VALER A NOSSA CONSTITUIÇÃO QUE GARANTE,"TODO PODER EMANA DO POVO...".
É PAUTA DO TRIBUNAL POPULAR DO JUDICIÁRIO E DAS REDES E FÓRUNS DE CIDADANIA DO MARANHÃO.
"O MARANHÃO,NOSSO CHÃO DE LUTA"
REDE DE DEFESA,NÚCLEO DE CANTANHEDE

Genésio disse...

Tenho certeza, quando isto acontecer esta justiça d Brasil vai servir a todo o povo sem distinção, porque hoje só rico tem vez.

Anônimo disse...

A iniciativa de discutir sobre o judiciário no maranhão, só aconteceu com a organização do nosso povo,que provou mais uma vez que:
"Povo organizado, luta e vence".

Márcia Natalina
Rede de Defesa, núcleo V. Grande

Rafael Araújo da Silva disse...

Esse é um caminho para aproximar mais o judiciário da república. Essa luta precisa ser feita.

Rafael Codó-Ma.